sexta-feira, 12 de novembro de 2010

sala de espera no centro de saúde


ontem dirigi-me ao centro de saúde para um consulta fora de horas com o médico de família, pessoa que desdenho imenso pela falta de amabilidade que tem com os seus doentes, apresentei-me à hora marcada e esperei a chamada na sala de espera. curioso, pensei, não cheira a hospital, aquele cheiro próprio dos hospitais como os dentistas cheiram a dentistas, os cabeleireiros aos produtos capilares e secadores de cabelo abafando o ar,  as padarias/pastelarias a pão e bolos, e as clínicas têm aquele cheiro a ar filtrado, coisa que estranhamos sempre - devemos estar habituados à imundice, sei lá. havia nove pessoas quando me sentei numa cadeira perto da janela que dá vista privilegiada aos cigarros a meio do expediente do pessoal auxiliar e médico. sento-me sempre naquela cadeira. catorze horas e quinze minutos, atrasado; já não seria às catorze horas desse dia a minha consulta, suspirei apelando à paciência e deixei escapar um sorriso de mal evidência. via uma mãe com duas filhas. a mais nova irrequieta, não devia ter mais que os nove anos se tanto. a mais velha pisava os treze e daí o pé torcido, talvez. quatro cadeiras à esquerda da senhora estava uma filha quarentona com a sua mãe sexagenária, a senhora teria já alguma doença avançada, ouvia-a contar repetidamente 1, 2, 3... // 1, 2, 3... // 1, 2, 3... parava, esfregava-se, batia com alguma força e determinação e retomava a contagem; à minha frente estava uma senhora na casa dos seus setenta anos com uma ligadura no pé. outra mulher estava com ela. pareceu-me ser sua familiar. no meu lado esquerdo a maior ternura de sempre. uma avó com o seu neto. duarte. rabugento e traquina. não tinha mais que era um aninho. duas senhoras ao lado deles sorriam deliciadas. eu sentia-me no meio da vida. de uma ponta à outra daquela espécie de sala de espera do centro de saúde tinha todas as gerações ali mesmo ao meu belo dispor. outra senhora juntou-se a nós. sentou-se ao meu lado direito e senti que ela queria meter conversa comigo pela forma como me olhara mas eu não queria conversas com ninguém, há dias assim. passou uma outra de cadeira de rodas. "caí! na vês agora a minha vida!!" dizia ela pouco antes da chamada à da minha frente. estive sentada naquela cadeira uma meia hora até ouvir no altifalante a voz do médico soar como a de um rinoceronte zangado não que alguma vez tenha estado perto de um rinoceronte ao vivo e a cores e ainda menos zangado mas o national geographic é bastante elucidativo nesses aspectos da vida humana. está mais gordo. e o mau humor vinca-lhe a cara cinquentenária  de rugas. estava mal disposto como sempre. não fiz os mínimos para fazer de conta que não me apercebi e ser simpática. passou outra caixa de medicamentos e disse-me que não sabia o que é que eu tinha. saí. na mão o último resultado de exames reclamado por mim e não por iniciativa dele, na outra a receita, nos meus ouvidos a frase descabida e dita a frio "não sei o que tens, que queres que te diga?!" e os meus olhos a encherem-se de água abafaram a minha voz quando passei na recepção e agradeci a atenção. desci as escadas. liguei à mãe. depois ao namorado. fiz uma marcação no particular. e é assim a grande maioria dos médicos deste país. são-no pela simpatia familiar, por que dá jeito um médico na família, dá nome, é um posto de respeito. é um erro. certas profissões (senão todas) merecem o mínimo de dedicação e paixão senão nunca nada tem o seu devido valor nem o efeito pretendido. desci as escadas sem ver quem ainda estava naquela sala de espera.

6 comentários:

  1. realmente é muito triste...

    Adorei o texto!

    Tu ao menos ainda tens médico de família, eu nem isso!

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  2. olha primo, se queres que te diga a verdade, é pior a emenda que o soneto! de nada vale ter um médico de família que não nos ouve e pouco faz de nós e por nós. tudo se arranja! e tu quando escreves?!

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  3. lamentável mesmo.

    melhoras pra ti.
    bjs meus

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  4. alte médico :)) muita fixe :) ihihihi

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  5. Realmente... Somos nós que pagamos o salário aqueles indivíduos e somos tratados desumanamente!

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  6. menina fê,
    obrigada, felizmente não é nada grave.

    márcio,
    não se brincam com estas coisas, não sejas assim :)

    masquediabo,
    pois somos e devemos pagar muito mal já que o atendimento é assim... ?? :)

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