quarta-feira, 2 de março de 2016

rua dr. Francisco Sá Carneiro

"sim, vá anda lá!!! deixa a montra S.!"
"oh mas olha só aquele! não é lindo?"
"sim, sim... está aí desde a semana passada!"

era mais ou menos assim a nossa conversa sempre que passávamos na rua Dr. Francisco Sá Carneiro no tempo que havia por lá uma loja de noivas!
eu e a S'inha. tornámo-nos amigas inseparáveis logo nos primeiros dias de escola. ela muito tímida, eu meio sem jeito numa escola tão grande, que cabia a minha escola primária p'raí umas dez vezes! com uma sala de aula só para o meu ano escolar, aliàs, várias!! e muitos mais colegas que aqueles que tive, a salientar, no 4ºano: um! um colega!
a S. sempre foi um doce. cabelos longos de um castanho aloirado, olhos muito grandes, de um tom amêndoa tão suave que, às vezes, quando olho para a Ziva, parece-me ver os dela. uma pele clara. canhota. aquilo era novidade para mim! nunca tinha visto ninguém escrever com a mão esquerda. ouvi dizer que havia gente que escrevia com as duas! tomara eu conseguir escrever com a direita e com uma letra que orgulhasse o meu pai, que não tinha uma letra só que fosse exemplo, e perdi a conta aos cadernos de duas linhas que a minha mãe, insistentemente, comprava.
a S. era uma romântica! eram desenhos com
imagem tirada daqui
imagem tirada daqui
corações, e passarinhos e flores, fora a quantidade de rapazes e raparigas - desenhados por ela e recortados por mim - de papel com que ensaiávamos histórias de amor; às vezes retratávamos uma história que gostávamos que acontecesse connosco. havia sempre uma paixoneta no ar.
a S'inha. sonhava casar de véu e grinalda. um vestido enorme. numa igreja cheia de flores.
eu achava aquilo uma seca. ainda por cima que os vestidos eram um absurdo de preço - desculpem-me as noivas e as lojistas, não quero desdenhar de coisa alguma.
eu nunca quis ser dona de casa. sempre defendi a senhoria do meu nariz! sem incluir celibato, claro está! nunca sonhei com véus nem grinaldas, nem bouquês ou promessas de amor eterno.
a S. cresceu. e mudou de idéias.
eu também cresci. e também mudei as minhas.

mas às vezes, é tudo um sonho. 


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