quinta-feira, 12 de agosto de 2010

cheirinho a pão quente pela manhã

passou por mim esta manhã a carrinha da pastelaria ao fundo daquela rua de calçada. "uma entrega", pensei. no meu passo descansado pela manhã desci-a vendo as montras e olhando de tempos a tempos o céu nublado que prometia a irritante chuva-molha-parvos. alcancei a carrinha ao fim de uns metros e eis senão o cheiro inebriante que me fez fechar os olhos e inspirá-lo como que fosse para o guardar dentro de mim...
toda a minha infãncia foi passada num desses casalinhos, tão típicos de portugal. não que fosse tão isolado mas porque assim calhou na geografia - só lá ia quem tinha de ir e saía exactamente pelo mesmo sítio que entrava. todavia tínhamos o homem da fruta à sexta-feira ao meio-dia mais ou menos em ponto, o peixeiro quase dia-sim-dia-não, as alfaces à mão de apanhar, os tomates maduros a cair dos tomateiros, o cantinho das meloas, as àrvores de fruto, as flores nos jardins, dias e dias de sol que parecia que só ali caía o sol embora quando chovesse chovia e quando o vento soprava bania tudo à sua frente.
mas todos os dias, todos os dias, tínhamos o padeiro a tocar a buzina à porta e o ritual era mais que certo: tínhamos sempre um saquinho de plástico com uma carteirinha com trocos e um bocado de papel rasgado com o pedido de um "papessêco" ou um "pão grande" outras vezes pequeno. vinha sempre às seis horas da tarde. ao entardecer aquilo era como o néctar dos deuses. uns anos mais tarde tínhamos também de manhã. era uma padeira. vinha por volta das cinco horas mas aquela era louca. eram sempre grandes travagens, grandes arranques e grandes faltas de troco! mas de vez em quando compensava-nos punha pão e troco. outras nem uma nem outra. era um stress! e só lhe comprávamos vianinhas.
aquele padeiro da tarde não. aquele era um homem como deve de ser. um rapazinho novo, que fazia as delícias minhas e as de uma prima, e o pão era uma delícia...
lembro-me de ouvi-lo tocar na casa da minha avó e esperar um pouco para ir ao encontro dele quando parasse à minha porta. ia meter conversa. o moço era simpático. e o cheirinho a pão... humm... que delícia. era uma fusão de cheiros. a imagem é simplesmente deliciosa. o entardecer - da minha casa ainda se vê no horizonte um rasgo de mar. uma luz amarela dentro da carrinha. o cheiro a pão com chouriço. o cheiro dos bolicaos caseiros, das arrufadas, dos bolinhos secos que não me recordo o nome, do pão quente. era, por isso, decepcionante quando sentia o pão arrefecido nos meus braços... mas valia a pena... o cheiro. as cores. as conversas. a face corada por causa do padeiro que entre nós era (e é!) cá um pão...

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